VIAGEM A PÉ PELAS NOVE ILHAS DOS AÇORES REALIZADA EM 2012 PELO JORNALISTA NUNO FERREIRA (REVISTA EPICUR E REVISTA ONLINE CAFÉ PORTUGAL, autor do livro "PORTUGAL A PÉ", EDIÇÃO VERTIMAG) APOIO VERTIMAG, Pousadas de Juventude dos Açores e SATA Contacto: nunocountry@gmail.com
segunda-feira, 27 de agosto de 2012
BAILE NA SOCIEDADE DE SANTO ANTÃO
Uma fiada de lâmpadas ilumina a rua e a fachada da Sociedade Recreativa de Santo Antão, em São Jorge. Umas horas largas depois da garraiada, algumas dezenas de pessoas sentam-se em círculo num amplo salão com palco num dos fundos e um primeiro balcão no outro. Como é costume, o baile começará tarde. São 23h00 e o que se sabe é que os “músicos” continuam a ensaiar no piso de cima. São todos filhos da terra e vêem ali tocar por amor à causa. “Não levam nada por vir tocar”.
Um deles é Luís Melro, 59 anos, que não larga a sua viola da terra construída na oficina do construtor local Raimundo Leonardes, do Topo. Luís é de ali perto, do Cruzal e começou a tocar nos bailes há muito tempo, quando os bailes ainda ocorriam apenas pelas matanças do porco.
“Era em Janeiro, durante a matança do porco e organizado pela família que matava o porco”, explica Luís. No livro “São Jorge” (Trechos da Nossa História), Frederico Maciel conta como acontecia noutra freguesia, a do Norte Grande: “Havia bailes durante uma semana” porque toda a família tinha a sua matança do porco e consequentemente baile. Algumas pessoas vinham a pé vestindo as melhores roupas mas poupando os sapatos dentro de uma saca para o baile. Os homens colocavam gravata e algumas raparigas rosas de papel. Iam e vinham a pé de casa para o baile e vice-versa.
Dançava-se o que ainda se dança hoje, bailes de roda mais lentos e a mais rápida chamarrita, em quatro ou oito pares. Tal como hoje, os músicos (viola da terra, violão, violino) entregavam a roda nas modas mais lentas e tocavam fora durante a chamarrita.
Para poderem ir dançar e namoriscar a outras freguesias, a maioria dos rapazes procurava aprender a bailar, normalmente ao fim dos dias de Inverno. Alguns tocadores, conta ainda Frederico Maciel, “só deixavam entrar na roda quem sabia bailar”.
Já antigamente, os bailes começavam tarde (pelas 10h00), à luz de candeias, candeeiros de petróleo ou velas. Os donos das casas ofereciam doces regionais (rosquilhas fervidas, esquecidos) juntamente com aguardente. “Os tocadores e cantadores”, narra Frederico Maciel, “ recebiam uma açorda com aguardente ou vinho quente com água e açúcar”.
Luís Melro, um dos músicos que anima o baile em Santo Antão nessa noite, é desse tempo mas está feliz de ver a tradição regressar em força. “Houve uma época em que os bailes estavam a fracar e faltavam tocadores. A emigração levou muitos”. Luís Melro também esteve fora, oito anos em Turlock, Califórnia, Estados Unidos. “Quando voltei havia quem tocasse viola aqui em Santo Antão mas não havia quem mandasse na roda do baile. Comecei a mandar no baile e dei aulas no Topo e aqui. Apareceu muito pessoal. Agora há muitos tocadores e muitos bailes regionais”.
Os bailes que dantes se realizavam pelas matanças do porco em Janeiro, realizam-se agora na força do Verão porque é quando há mais tocadores e afluência devido aos emigrantes que visitam a ilha.
Já passa das 23h00 quando os tocadores descem as escadas da sociedade e entram no salão sob a expectativa e os olhares ansiosos de casais sentados nas cadeiras encostadas à parede pejada de retratos que marcam momentos importantes da instituição. Com Luís, vem o irmão, Isidro Melro, no violino, Geraldo, bandolim e Hermenegildo, no violão.
A roda forma-se e o baile começa enquanto lá do outro lado, os mais novos jogam bilhar, vêem televisão, bebem minis de cerveja ou conversam na esplanada no exterior, junto a um assador que larga fumo para o negrume da noite de Santo Antão.
O baile, que ganha contornos mais frenéticos e exigentes durante a chamarrita, prolonga-se pela madrugada e ninguém parece com pressa de regressar a casa, apesar de se tratar da noite de domingo para segunda.
A tradição está de novo enraizada na Ilha de São Jorge, circula em dvd’s que os emigrantes levam para a América do Norte e reproduzem nas sociedades na diáspora. “Eles organizam lá fora os bailes exactamente como aqui ou melhor ainda”, contam.
Luís Melro está feliz. Apresenta um jovem que ensinou não apenas a tocar viola da terra mas “a mandar” durante o baile de roda. Em pelo menos uma moda, será o rapaz a mandar, com a voz assertiva, sincopada e forte que se pede a um mandador.
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ResponderEliminarSeis musicos com tres cantoras
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Palmela