VIAGEM A PÉ PELAS NOVE ILHAS DOS AÇORES REALIZADA EM 2012 PELO JORNALISTA NUNO FERREIRA (REVISTA EPICUR E REVISTA ONLINE CAFÉ PORTUGAL, autor do livro "PORTUGAL A PÉ", EDIÇÃO VERTIMAG) APOIO VERTIMAG, Pousadas de Juventude dos Açores e SATA Contacto: nunocountry@gmail.com
domingo, 28 de outubro de 2012
VIDA DE CAPINHA
Valverde, Madalena do Pico. Dezenas e dezenas de pessoas acotovelam-se em muros, vedações e à janela. Na rua, um homem jovem, magro e esguio enfrenta o touro de todas as formas. Dança com ele, ergue à sua frente uma capa ou um guarda- chuva colorido e rodopia antes que possa ser atingido. É o “capinha”, o homem que o ganadeiro trouxe para abrilhantar a tourada, torna-la mais apetecível e fazer com quem outros lhe sigam o exemplo e queiram brincar com o touro também.
Nesse dia, o capinha, ao contrário das minhas expectativas, não é terceirense. Chama-se Carlos Eduardo Maia Silva, tem 32 anos e é de São Miguel. “Eu sou de Ponta Delgada mas fui para a Terceira com 18 anos. Um dia, há uns 12 anos, nos Biscoitos, numa tourada à corda decidi brincar em vez de fugir. Depois, fiquei a viver na Terra Chã e comecei a chamar touros”.
Carlos trabalhava nas obras até às 18h00, saía e ía para a tourada à corda ( de Maio a Outubro na Ilha Terceira chegam a existir três por dia). “Era complicado mas era um gozo que eu tinha, adorava aquilo”. Os ganadeiros começaram a chamá-lo cada vez mais para capinha. “O problema é que cada vez chegava a casa mais tarde e a mulher ficava zangada comigo”.
Desde há dois anos que Carlos mudou da Terceira para São Jorge. “Vivo no Topo, é mais sossegado. A minha arte é de pedreiro mas também vou às lapas e ainda agora estive três semanas a ceifar milho. Os touros é sempre que me chamam”.
Para se ser capinha, sobretudo na Terceira, onde existem touros bastante difíceis, é preciso alguma dose de loucura. Tem de se marcar o touro mal este sai da gaiola e escolher a melhor posição. “Coragem, sobretudo coragem e sangue frio. Não podes ir a tremer para a frente do animal e se fores pegado nunca deves perder a fé”, explica.
Nestes anos todos, Carlos já sofreu ferimentos com a corda e já foi atingido no peito pelo touro. “Nunca fiquei mais de três dias em casa, graças a Deus”.
Além da gratidão e aplausos do público- “dão-me os parabéns”- Carlos sempre recebe do ganadeiro. “Ele dá alguma coisa ou paga a comida e a bebida e eu não preciso de mais nada”.
Na Ilha Terceira, Carlos tinha de concorrer logo antes da época começar com os outros capinhas. “Lá havia uns 15. A gente ía vendo qual o ganadeiro que precisava de pessoal”.
Enquanto em São Jorge ou ali no Pico, Carlos tem mais margem de manobra à frente do touro, na Terceira é mais difícil. Lá a febre de enfrentar o animal é enorme. “Na Terceira quando nós chegamos já estão dois ou três indivíduos à nossa frente. Todos querem brincar e não te respeitam tanto. Em São Jorge e aqui é diferente”.
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